“Nós Vivemos Felizes Durante a Guerra”, de Ilya Kaminsky (1977) Tradução de Bruno M. Silva

 E quando eles bombardearam as casas dos outros, nós
 
protestamos
mas não o suficiente, nós opusemo-nos mas não
 
o suficiente. Eu estava
na minha cama, à volta da minha cama a América
 
caía: casa invisível a casa invisível a casa invisível.
 
Levei uma cadeira lá para fora e olhei o sol.
 
No sexto mês
de um reino desastroso na casa de dinheiro
 
na rua de dinheiro na cidade de dinheiro no país de dinheiro,
no nosso grande país de dinheiro, nós (perdoem-nos)
 
vivemos felizes durante a guerra.




Eufeme n.º 12

capa Eufeme n.º 12















 Esta edição conta com a participação dos poetas:

Adão Contreiras; Adília César (Khroniká); Ana Paula Inácio; Bruno M. Silva;
Eduardo Quina; Henrique Manuel Bento Fialho; Jenny Xie (trad. Sérgio Ninguém);
Maryann Corbett (trad. Isilda Ribeiro); Peter Levitt (trad. Sérgio Ninguém); Sara M.
C. Borges; Sérgio Ninguém (Poetas & Poetas) e Sofia Ferrés.

Com o preço habitual de 7€. Os pedidos podem ser feitos através de:

Eufeme: eufeme.magazine@gmail.com
Livraria Poetria (Porto)
Livraria Flâneur (Porto)
Livraria Snob/Cossoul (Lisboa)

“Mãe”, de Nagase Kiyoko (1906-1995) trad. Bruno M. Silva

Estou sempre ciente da minha mãe,
tenebrosa, ameaçadora,
uma dor no fundo da minha consciência.
A minha mãe é como uma concha
que facilmente se quebra.
No entanto, não posso mudar
o facto de eu ter nascido
carregando a sua sombra.
Ela é como um sonho doce e cruel
que os meus nervos não esquecem
mesmo depois de eu acordar.
Ela impede toda a liberdade dos meus movimentos.
Se eu me movo, ela rapidamente se quebra,
e os estilhaços apunhalam-me. 

Três poemas de Yosano Akiko (1878-1942) trad. Bruno M. Silva

 Aquela que carrega
no seu coração um amor
sabe que deve ser infeliz,
encoberta por nuvens pesadas,
nunca lhes verá o fim
sob os vastos céus.
 
~
 
Iludo-me ao pensar
que tu estás comigo
enquanto atravesso os campos
de flores, sob o luar.
 
~
 
O meu coração é como o sol,
afundado pela escuridão,
húmido da chuva,
batido pelos ventos.

Três poemas de Fujiwara no Teika (1162—1241) trad. Bruno M. Silva a partir da versão inglesa de Steven D. Carter

 Ouve, tu que não
pensas na tristeza das coisas –
escuta aquele pato selvagem
grasnando sobre um lago gelado
numa aldeia da montanha.
 
~
 
Nada restou
daquele vento tingido de flores
que encheu o meu jardim.
Aqueles que agora me visitam
verão apenas neve caída.
 
~
 
Na praia de Matsuo
eu espero na escuridão entre os pinheiros
por alguém que nunca virá –
e como os montes de sal incandescentes,
também eu sou consumido pelo fogo.

“Retrato de uma Mulher”, de William Carlos Williams. Tradução de Bruno M. Silva

  As tuas coxas são macieiras
cujas flores tocam o céu.
Qual céu? O céu
onde Watteau pendurou o chinelo
de uma mulher. Os teus joelhos
são uma brisa do sul – ou
uma rajada de neve. Ah! que
tipo de homem era Fragonard?
- como se isso respondesse a
alguma coisa. Ah, sim – por baixo
dos joelhos, já que o tom
desce por aí, é
um desses dias brancos de verão,
a erva alta dos teus tornozelos
cintila sobre a costa –
Qual costa? –
a areia prende-se aos meus lábios –
Qual costa?
Ah, pétalas, talvez. Como
posso eu saber?
Qual costa? Qual costa?
Eu disse pétalas de uma macieira.