“Calma”, de Giuseppe Ungaretti (1888-1970), trad. Bruno M. Silva

As uvas estão maduras, o campo lavrado,

A colina desprende-se das nuvens.

Nos espelhos empoeirados do verão
A sombra caiu,

Entre dedos incertos
O seu brilho é evidente,
E distante.

Com as andorinhas voa
A última angústia.


(a partir da versão inglesa de Patrick Creagh, Selected Poems, Penguin)

“Bem dentro de nós”, de Vasko Popa (1922 – 1991), trad. Bruno M. Silva

I

Erguemos as mãos
A rua sobe até ao céu
Baixamos os olhos
Os telhados pendem para o a terra

De cada dor
Que não mencionamos
Um castanheiro cresce
E misterioso permanece por trás de nós

De cada esperança
Que nutrimos
Uma estrela levanta-se
E move-se inatingível à nossa frente

Ouves o tiro
Que voa entre as nossas cabeças
Ouves o tiro
Que guarda o nosso beijo


(a partir da versão inglesa de Anne Pennington, Selected Poems, Penguin)

“Silêncio”, de Giuseppe Ungaretti (1888-1970), trad. Bruno M. Silva

Mariano, 27 de Junho 1916

Conheço uma cidade
que todos os dias se enche de luz
e nesse instante tudo se encanta

Eu parti certa noite

No meu coração o estremecer das cigarras
continuou

Da branca
embarcação
eu vi
a minha cidade desaparecer
e deixar
um enlace de luzes
por um momento
no ar turvo
suspensas


(a partir da versão inglesa de Patrick Creagh, Selected Poems, Penguin)

“Uma cabeça desabrigada”, de Vasko Popa (1922 – 1991), trad. Bruno M. Silva

Uma cabeça decepada
Uma cabeça com uma flor entre os dentes
Errante circunda a terra

O sol encontra-a
Faz-lhe uma vénia
E segue o seu caminho

A lua encontra-a
A ela sorri
E não pára de seguir o seu caminho

Por que rosna ela à terra
Não poderia voltar 
Ou partir para sempre

Os seus floridos lábios saberão


(a partir da versão inglesa de Anne Pennington, Selected Poems, Penguin)